você que tem folhas mortas dentro dos olhos,
você que eu não sei jamais, e que sou jamais.
você que ensinou o vazio e a cruz enaltecida.
você fala de coisas em um passado repentino.
você fala pouco, muito pouco, mas teus olhos
mostram folhas e as folhas mostram árvores.
sempre tive medo, velho, velho medo sempre.
aprendi talvez o medo na ternura do silêncio
pescado junto às sobras do que não pudemos
fazer por cada um de nós na hora precisada.
a hora conjunta em que se ergue a paz falsa.
levo tuas folhas em algum caixão de amor.
o amor de onde vim e para onde não voltei.
hoje procuro o amor e encontro o que racha.
o amor é uma coisa e a palavra amor é outra.
tenho perguntas e nenhuma letra que forme
a vulgaridade das perguntas que tenho sem
que impere fazê-las quando rondam ruínas
por nossos corpos que procuram a palavra
e duvidam tê-la achado e dizem sem parar.
o silêncio do ódio é nossa língua materna.
cantamos raivosos a língua tímida do veto.
amamos em silêncio o que não tentamos.
os barulhos dessa vida já não te assustam?
tenho medo dos remédios porque a cura
não tem espaço onde seria doce a perda.
nossa perda compartilhada não vocifera
os decibéis de erros em que nos víamos
tão parecidos quanto desfiles de samba
mas sem a consciência de toda a máfia
que cria as festas, cria crias, cria choro.
a bateria não recua em nosso carnaval.
quero rever a beleza de todo esse ódio.
quero nomear tua estirpe meu presídio.
quero sofrer devagar, como um velho.
ser o pássaro que nos teus olhos meus
bica as flores gordas de nosso musgo.
vê, pai, que vejo as coisas em blocos,
de torres roídas de onde corpos pulam,
mas não despejo frases em linha reta.
melhor, despejo, mas veja como ficam
fora da nossa babel de coisas a dizer.