5.1.20

“mãos e cordas – outra década”



sei que nossa corda é firme,
mas é preciso mãos para puxá-la.
vejam só como se parece
uma corda firme largada
no chão do fim de uma década,
no chão do fim de uma feira,
da feira que dura uma década.

olhem bem para o chão
pela última vez no que se fecha
e abre um novo ciclo provisório.
a mesma corda sempre firme
mais parece um clown
embrulhado de maldade
sem o carinho cheio de suor
das mãos que choram medo
e transpiram frustração translúcida.

alguém que caiu no meio da festa
e não houve tempo de perceberem,
essa corda é firme, mas sem mãos
ela fica assim como o cigarro
que a chuva molhou enquanto
alguém ainda pensava no amor.

pode ser também a mesma corda
da qual desistiu o palhaço suicida
e que ficou ali, no fim da feira,
largada enquanto ele seguiu
com a cara triste da qual se ri
o mais digno fiel da procissão.

seguir talvez seja puxar a corda,
com cuidado para que não estique
a ponto de estarmos curados,
de não mais precisarmos da corda.
e nunca mais veríamos as mãos
e nunca mais diríamos preciso
da sua mão para puxar a corda.

uma corda precisa de pelo menos
duas mãos para não ser um chicote.
a uma corda é preciso uma disputa
e somente um tipo de disputa existe:
a que vale para erguer o derrotado
e será a calma de deuses coléricos
quando olharem finalmente para nós.
por enquanto somos mãos e cordas
e a terrível vontade de simbolizar
o amor que não sabemos entender.