5.9.25

"aos bons amigos"


neste momento estou cercado de tragédias,

que me fazem mais humano e desastrado.

 

livro-me de bons amigos como de pulgas,

dou-me conta de que são bons só para eles,

ou nem isso – se gostam de mim, são ruins.

 

por outro lado, eu tenho estado cercado,

neste momento, de figuras saltimbancas,

que trazem a ridicularidade dos santos,

que abrem mão de tudo que podem ver

para ficar apenas com o que não sabem,

mas trazem dentro de si e chamam deus.

 

há nessas figuras qualquer coisa de vil,

de inumano, que se inclina ao divino e

ri diante da nossa farsa de benfeitorias.

 

alguns não saem de casa nunca, outros        

vivem nas ruas porque dão à pobreza

o papel de musa inspiradora, amante.

 

os bons amigos, percebo, é provável,

também precisem de musas galantes.

mas temem perder tempo procurando

coisas que não sabem dentro do vazio.

 

infelizmente não sou beatriz, dulcineia,

angélica acorrentada, nem a liberdade

como guilhotina com os peitos de fora,

pintada por certo francês de se chamou

eugênio da cruz – ele também – eu não

mais serei menestrel da tortura idílica

com que alguns cantam suas vitórias

e despejam as derrotas na vala escusa

do ressentimento que surge ao verem

que nada é suficiente nunca – o ar frio

que penetrou nossas veias de bondade

torna burro o balanço do barco bêbado.

"Constant Sunday vs Lorde Byron"


talvez seja justo, como registro,

afirmar que você gostou de mim

sem que eu tivesse nada para dar,

estando eu mesmo desempregado.

ou seja: you liked my crazy looks!

 

entre a vida e o sonho que é você

tive boas perdas, péssimas perdas,

duras perdas – e perdas de alívio.

voltei a jogar futebol e – pasmo –

descobri-me um velho ambidestro.

 

não é fácil amar e ser inteligente

– na dúvida adotei um gato ruivo

que me faz companhia, me ama,

acredito que ele me ache bonito,

como você, mas eu prefiro gatos.

 

se viver é melhor que sonhar, não sei,

sei que é impossível amar um sonho,

pois sonhar é trivial e amar é imenso

como a vida e, ao contrário do sonho,

pode-se morrer de amor e não posso.

 

pois um gato chamado lorde byron

espera que eu retorne vivo do sonho

que é – que foi – você para fornecer

a comida mais real que vida, sonho,

você: que chamei domingo constante.

 

agora ando com uma faca no bolso

mais pronto, finalmente, para matar

do que para morrer, mesmo porque

descubro distúrbios, rasgo sinapses,

e o novo personagem também rouba.

 

mas quem sonha é o mesmo sempre,

é ele quem manda quando você vem,

quase um menino bonito que faz rir,

e domina sem altura o meu garrafão,

apenas para deslizar no aro mundano.

 

o mesmo que fornece nossas agendas

e come vida para que o sonho não dure

no calendário gelado de vários afazeres

que camuflam o medo de sentar, pedir,

receber e, por que não, até dizer adeus.