“If you can
bring nothing to this place
but your
carcass, keep out.”
(William Carlos
Williams)
a menina que puxa a perna e cuja dor
a faz sorrir sem força é a massagem do
tempo
sobre as panturrilhas dos meus anos.
sem ênfase – oh salvá-la! – salvá-la de
mim.
dar a ela ênfase de mim para que nunca
se desespere.
para que das minhas pernas taludas surja
o aleijão divino ainda embrionário,
fruto de um estupro perene, com dentes
abertos.
e com tua perna manca eu posso ter três
pernas.
que é o que sempre tive e nunca mais me
recordei.
porque quando amamos sempre surge o
terceiro fator.
brecha aveludada de mar bravio e
intoxicação lacrimosa.
que me faz perguntar: “algum dia tive?”
mas é o fim das perguntas, quero apenas
saber
sem pontuação de que forma preferes ser
penetrada.
e será em muitas posições as mais
variadas
e servirá para nos fazer gozar e
aumentar a dor
– florescer exige irromper a pele –
sem aresta de passo largo funcionaremos
em meio a gritos de assalto, crianças e
açoites,
seremos netos e avós sem saber como
encontrar os pais.
darei em minutos de ano a volta,
para erguer teu quadril por ora
devastado.
usarei tuas tintas e beberei tua atenção,
para rasgar com alguma dignidade os
quadros velhos
que no fundo nunca nos serviram e jamais
nos deixarão.
porque fungávamos de amor,
seminal amor dos que só podem amar.
aqui estou pela primeira vez apaixonado
e lúcido.
já que os bloqueios são apenas frases e
nosso grafite
se faz em movimentos firmes, gestantes.
alquebradas fases do que com a purpurina
de nossa carne
chamaremos nova forma, como nem mesmo
Carlos Williams pode ver com sua chave
médica.
ensina-me portanto o corpo finalmente
relacionado com a vida.
ensina-me finalmente o corpo-máquina
que até aqui decepou mãos suplicantes.
arranca-me da base de meus joelhos
estupefatos
e a cabeça afrouxará as rédeas do medo.
acaba agora com minhas ideias gestantes.
afasta-me – retorna-me à vida física sem
convicções,
plasma vivo sem amém.
quero tua história para que eu me cale
em desafio
e ressurja para ser a prova de vergonha
deglutida em foice pela aflição do
afeto.
dobra de causas minhas vazias
pretensões.
derruba o muro do meu fingimento fílmico
e deforma o meu silêncio imprestável.
assim termino.
voltar enfim para casa estuprado pela
vida
– e não ter mais casa.
matuta voragem de raízes, ingênua
comoção da química.
adeus ideia de conjunto, carinho de
gênese.
adeus beleza ensurdecedora do brutal
convívio,
poema supremo, estrada.
adeus Carlos Williams e seus dez passos
até o centro da velha cidade.
bem-vindo medo comprovado de toda beleza,
impossível beleza que acena de nossos
cílios,
a mancos passos de glória.