tenho agora quarenta
anos,
meu pai que tem
sessenta e sete
diz que usaremos
máscaras
antivirais pelo resto
da vida,
entre milhões de
variantes mortais
que terão nomes cada
vez mais feios.
ele diz que minha irmã
que tem onze
será uma pessoa que
muito pouco
lembrará a pessoa que
fui e quase nada
lembrará a pessoa que
meu pai foi.
eu mesmo lembro muito
meu pai,
mas não tenho ideia de
quem sou.
homens graves e feios
com gravatas
que parecem enforcar
seus pescoços
decidem se a vida no
mundo vale a pena
mesmo que seja possível
fazer com que
ela desapareça num
piscar de olhos.
tenho agora quarenta
anos,
a idade de jack london
morto
depois de pegar onda no
havaí,
depois de unir-se aos
zapatistas
e aos socialistas e aos
esquimós
e aos cães que puxam
trenós,
enquanto estou aqui
parado
e os homens enforcados
pelas gravatas do
destino dizem
coisas que não entendo,
decidem
se a vida no mundo vale
a pena,
aquela vida em que não
creio,
ou se pode explodir num
piscar
de olhos e desaparecer,
assim
como a casa de jack
pegou fogo,
e com ela o sonho de
jack london
evaporou com a força
dos seus rins,
enquanto a malária
voltava e talvez
quem visse dissesse: é
um homem
condenado de sessenta e
sete anos.
mas era jack london com
quarenta,
e nada do que fiz até
aqui se compara
sequer com uma noite de
sono de jack
– imaginemos uma noite
de febra alta
– até isso iria além
das minhas ações.
não encontrei a alma humana
nos olhos de um cão
siberiano,
mesmo assim, por
contraposição,
é lindo um poema em que
se possa
ter jack london como
parceiro,
pronto para morrer um jovem
sábio,
enquanto aqui o velho
já está morto,
o jovem adormece dentro
do sonho
de jack london pelo mar
da vida,
e tudo o que eu mais
quero é poder
aos quarenta não me
afogar na poça.
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