passei tanto tempo sem ter nascido
e agora trago essa creche na cabeça.
sem conseguir que o choro silencie,
sem poder dar às crianças uma teta.
fecho os olhos e penso: sou adulto,
uma pena: eu sou um adulto pleno.
muito sofrimento, quando sou triste,
é sinal de felicidade no meio do céu.
minha cabeça é a feira sem verduras
onde passaram a vassoura do poema.
congestionado o intestino da criação,
sacrifico com veludo úmido uma fé
pequena de sussurrar janelas-sereias
ao mistério de tudo tão quieto agora.
não sei nada e o engano do que vejo
é maldade no deserto da minha testa.
os poemas me saem como quadrado
ou como retângulo ou como o túnel
que liga a loucura até a primeira paz
e os berços em chamas à sede escura.
conforto os joelhos no prego só meu,
cuja ponta fez delírio, fez apocalipse
na crista de sal desta onda de náusea,
bonita porque vai e vem sempre outra.
a calma recobro com sacos de plástico
que enxugo como pulmões de pombo
e lembram dias felizes de asma e cura,
gordura órfã morta por outra hesitação.
nem que seja por um minuto no poema,
saber que estou do lado certo da
história,
para que um poderoso, ainda que inédito,
deus surja no sentimento digno de
classe.
não há que se forçar uma abstração
lúcida
no lugar onde se esbalda a carne
desperta.
escorrer como a síndrome do mecanismo
que é puro joguete ao lado do
superfrágil
rolar de ações que dá sentido ao novo
dia.
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