no fim dessa corrida
– mas ainda não é o
fim, quem vai saber –
é possível ainda olhar dentro
das mãos e ver
aquela coisa minúscula e
frágil que não é um bebê
ou mesmo a mínima
partícula infinitesimal
que nos conjura sermos
assim
e que trazemos através
de todos
os tombos de joelhos no
chão,
mas talvez não seja
fácil explicar
porque são acima de
tudo olhos
que se fecham ao que
enxergam
e se abrem ao que não
se pode ver.
são mãos que afastam o
que alimenta
e arrastam pequenos
demônios
com a cara pelo chão
do qual jamais nos
afastamos muito.
nos encontramos todos
no chão,
voamos sozinhos,
decolamos destrezas,
mas nos encontramos
todos no chão.
no momento todos voam e
dizem: estamos juntos.
que coisa fodida, ser
criança já naquela idade
em que um bancário
diria ah como estou farto!
tanta coisa gira na
cabeça e não consigo pescar,
reter as ideias boas como
um bebê de colo
– estou falando aqui
demais sobre bebês, não?
nos debatemos num
flashmob acinzentado
com as gargantas na
corda de mais uma década
(os anos loucos, eles
dizem) – queremos vencer
a corrida, mas já não
temos os pés confiáveis.
vejam só os buracos aos
quais somos levados
dentro da nossa peculiaríssima
impressão
de que estamos fazendo
tudo certo apesar
de estarmos vivendo
tudo errado – mas será?
sabemos como seria
intolerável
se tudo se encaixasse,
não é mesmo?
é uma palavra pastosa,
como a pasta dessa coisa
pequenina como um
pássaro recém chocado ao vidro da janela,
essa que teimo em
driblar, fazer esquecer a minha volta,
que engulo como pílula
especial de um sci-fi dublado,
nesse ritmo rebolante e
hang loose que nunca esperariam de nós,
vejam que beleza, ficando
velho, como os dentes sangram
do espancamento
filosófico de cada um de nós,
das coisas que não se
acertam, dos despejos
de alma e de geografia
que nunca se acabam,
que nos alimentam na
verdade com essa pasta volumosa
que trazemos de bruços
enquanto o assaltante com faca
nos chuta no chão de
todas as nossas esperanças –
o milagre, essa palavra que soa como desistência,
mas não é, somos nós
aqui, esse milagre, essa coisa triste
que não sabe e diz, que
não sente e sofre,
que segue andando por
aí e se pergunta muitas vezes
aonde irão nossas
cabeças, essas belezuras empoeiradas
que limpamos como estantes
velhas de metal,
que enferrujam as fotos
da nossa emancipação recente,
uma banda indie
argentina incapaz de lotar um vagão de trem
com tamanha empolgação
juvenil dos seres banalizados,
santificados por
estranhas conjunturas, empoderados e mudos,
correndo de olhos
fechados e boca aberta para ultrapassar
a linha desértica dos
afetos diários que se esvanecem
como os bares de fim de
noite onde se toma sopa
– somos nós também ali
na fila da sopa, alguns bem arrumados,
outros nus, os pós-futuristas,
discorrendo banquetes.