3.9.13

"as datas"


Escrever história significa
dar fisionomia às datas

(Walter Benjamin)


é preciso no entanto dar nome às datas
essas feras esquecidas que só nos visitam aos pedaços
o amor pelas datas e a vontade imensa de lembrá-las
nada são as datas são futuros provisórios
que se alteram conforme precisamos delas
onde do outro lado está uma invenção
porque é simplesmente impossível agora lembrar
e no entanto é preciso dar nome às datas
o dia em que perdi a libido a noite em que me suicidei
o capacete alemão reluzindo à entrada do esconderijo
as marcas essas nunca perderá tempo olhando para elas
e nem mesmo os anjos as encontrarão no teu corpo
e só poder falar da rosa e nunca ter visto a rosa
e comer a rosa e esfregá-la embaixo dos braços
talvez até despetalar a rosa ou usá-la como pedra
por afinidade de parentesco endoidecê-la para enfim
te deixares consumir pelo que fora do drama não é rosa
e é tudo que é só teu e de mais ninguém e nunca vês
porque procuras a rosa com que criarás teu final instável
e aparentemente seguro porque criando a rosa sorris
mas sabes todos sabemos quanto há fora da rosa
que nunca poderás tocar e jamais deixarás de pensar nisso
ainda que com tua rosa inventada na mão corroída
e a chuva cairá sobre ti um dia uma chuva fortíssima
e tu dirás a ti mesmo outra vez uma outra data
como o dia em que a chuva pobre essência incompreensível
que apesar de solícita é inepta e por todos os lados ouves
abstêmio confuso magro com o queixo tremendo impossível
limpando-se de si mesmo escorrendo devagar
o que não sabe se é algo ou tudo o que nunca soube ou teve
e se for tudo haverá de ser ao menos enlouquecido
porque dessa forma já não dura muito a rosa criada
não é preciso mais um holocausto para definir a espécie
que venham as datas e debaixo das datas a rosa
e dentro da rosa o não dito em seu corpo imperturbável
não tens agora inteligência para o verbo concluso
e a poesia gosta de coisas caras como as datas
que marcadas definem a fisionomia da morte. 

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