16.5.12

"cair de amor"


é preciso cair de amor,
é preciso, é mais que tempo,
que seja uma terrível queda,
uma intolerável queda de amor.
quando me olho no espelho,
quando fecho ou tiro o cinto,
quando compro bússolas,
quando observo as vitrinas,
quando faço mal a barba
ou não faço a barba por semanas,
quando vejo um gato na chuva
ou me envergonho se Karen Dalton
enruga meu ventre com micro tons,
quando eu me virar assustado,
eu sei, é preciso, não há mais
tempo para fugas, não tenho mais
muito da minha reserva pessoal
de amor e quando pisco nas ruas
ou visto minha nobre jaqueta emprestada
e me atribuo tapinhas de incentivo,
quando fumo como um detetive suíço
ou faço as vezes de comediante asmático,
não pode ser, inevitável, existe prazo
limite para tudo e agora, sim, agora,
é mais que preciso cair de amor.
então não venha me falar quando
tivermos percorrido quilômetros
e na hora não soubermos dizer.
cair de amor, não existe a hora,
amor é o que faz cair e caído
permanece aos pés do que aos pés
é preciso cair, nas ruas, em postes
nas filas dos desempregados,
nas blitz policiais e nos Bálcãs,
mesmo em cemitérios é possível,
nas fases de luto ou sem sorte,
bater e cair, quando, suando,
estiverem ainda desempenhados
os pedaços da vertigem solene.

Um comentário:

Anônimo disse...

Uma beleza sem som e triste. Bj. Mary