21.4.06

“punheta no chuveiro da solidão”

não queria pensar em mim
mas agora que estou sozinho
e as paredes parecem famintas
sinto o fio gelado de uma faca
tudo balela! pura mentira!
não quero fazer poesia
preciso dizer a verdade
esse trapo sujo de sonhos
que espreita cada engano
alguns chamam de tristeza
ou talento para enxaqueca
esse frio que vem da espinha
ou que vem debaixo da mesa
essa vontade de se pulverizar
não abrir nunca mais os olhos
essa necessidade cega de luz
de desconfiar que existe a luz
às custas da água que pinga
eu mesmo sozinho como vim
não queria pensar em mim
mas deu que perto do fim
só me resta a mim mesmo
porque o resto é um confuso pesadelo
boca aberta do caos na minha têmpora
dentro desse lugar fantasmagórico beco
onde os escombros dos barcos guiam dedos
que escrevem sobre náufragos acorrentados
e vejo que eles vão ficando acinzentados
desejo reumático em corpos imaginários
porque agora já consumi minha visão
sou som cego sem ser só afeto perdido
substância cinza medula espinhal inflamada
sou a bula do fim agora que tudo mais é frio
estou sozinho envergonhado da minha pele
os ossos socados em sacos de culpa e noite
agora que estou sozinho sentado esperando
aquele futuro que corroeu minha esperança
esquenta os ladrilhos do banheiro com pena
janelas gargalham como velhas tias de vidro
pés cravados num alçapão de sentido nervoso
você não está aqui porque nós nunca existimos.

sentindo a solidão do esperma viciado
procuro sombras nas paredes do amor
o vento só deve desculpas ao silêncio

água limpa pinga morta nas minhas mãos
enquanto outro natimorto desiste de mim.

Um comentário:

Anônimo disse...

gostei muito leo.