4.3.24

"para bataille"

 

li num livro outro dia,

pois ninguém poderia

me contar algo assim,

que o artista deve

começar sua obra

como um assassino

afia a lâmina da faca

para matar alguém.

e que, ao fazer arte,

o mundo se tornaria

seu principal inimigo.

 

isso me fez pensar

que é função da arte

esfaquear o mundo

e da culpa pelo crime

fazer nascer o detalhe

que autoriza a viver.

 

pendurar o mundo

num poste e dizer:

aqui jaz este mundo.

depois sentir medo

e começar de novo.

importante o medo,

ou seria publicidade

e não a grande arte.

 

fecho os olhos, vejo

diminutas silhuetas,

criaturas apavoradas

com facas nos bolsos

na fila do prostíbulo,

ou da boca de drogas

ou à procura de deus

por trabalho e prazer.

 

ouço do alto do poste

uma risada grotesca

da mais pura paixão

do que excede à arte.

 

e penso compassivo

nas pessoas que suam

porque lhes tremem

as mãos que seguram

armas que poderiam

por via dessa degola

expulsar do mundo

as pessoas tranquilas,

alinhadas na certeza

da amizade pela vítima,

que nunca transpiram

e sabem o que fazer.

 

no crime um segredo

se fantasia de santo.

pois apenas o santo

é o algoz e a vítima

dessa grande ilusão:

um jogo de crianças,

à procura de seus cus

nas páginas do livro.

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