li num livro outro dia,
pois ninguém poderia
me contar algo assim,
que o artista deve
começar sua obra
como um assassino
afia a lâmina da faca
para matar alguém.
e que, ao fazer arte,
o mundo se tornaria
seu principal inimigo.
isso me fez pensar
que é função da arte
esfaquear o mundo
e da culpa pelo crime
fazer nascer o detalhe
que autoriza a viver.
pendurar o mundo
num poste e dizer:
aqui jaz este mundo.
depois sentir medo
e começar de novo.
importante o medo,
ou seria publicidade
e não a grande arte.
fecho os olhos, vejo
diminutas silhuetas,
criaturas apavoradas
com facas nos bolsos
na fila do prostíbulo,
ou da boca de drogas
ou à procura de deus
por trabalho e prazer.
ouço do alto do poste
uma risada grotesca
da mais pura paixão
do que excede à arte.
e penso compassivo
nas pessoas que suam
porque lhes tremem
as mãos que seguram
armas que poderiam
por via dessa degola
expulsar do mundo
as pessoas tranquilas,
alinhadas na certeza
da amizade pela vítima,
que nunca transpiram
e sabem o que fazer.
no crime um segredo
se fantasia de santo.
pois apenas o santo
é o algoz e a vítima
dessa grande ilusão:
um jogo de crianças,
à procura de seus cus
nas páginas do livro.
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