desejaria também gritar
pela janela,
mas nada me diz que seja
um grito coletivo.
grita-se mil vezes por
motivos que se engolem.
isso é o ser humano, parece
possível apontar.
mas não parece possível
dizer muito alto.
o que é isso que
chamamos ser humano?
o que é você? –
perguntavam humanos
nas peças elisabetanas e
aquilo sempre
me chocou um pouco,
dizer algo assim,
com tamanha naturalidade
– ficava eu
imaginando aquilo sendo
dito no palco
por um homem com roupas
esquisitas
e no fim era bom e eu
dava uns risinhos.
mas o que é você? –
pergunto ao espelho
enquanto vejo meus
pelos que não param,
eles não pararão nem
mesmo no caixão –
meus olhos cada vez
mais claros e perdidos.
tudo é essa
contradição: a boca que beija
de augusto dos anjos, a
mesma que cospe,
por isso não grito, não
beijo, não cuspo.
estou em silêncio
total, hoje não fui bem
com as palavras mais
uma vez, que terrível
é imaginar que algo com
que vou tão mal
seja a única coisa que
me interesse aqui.
quantos gritos se
engajam na vergonha
que substitui o
arrependimento e junto
à mania de grandesa nos
libera da culpa?
eu queria hoje escrever
um poema curto,
mas não consigo agora,
aparentemente.
as paredes às vezes se
fecham e preciso
gritar e não grito e
escrevo nesse lugar
que sairia melhor como filme
de terror.
entre os poucos
afazeres que me permito
passo mal com o desejo
voraz de escrever
este poema curto e que
diga tudo e salve.
então faço poemas longos
porque aqui
a vida é longa em seu
menor momento.
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