22.11.18

“poema para teu cigano”


agradeço aqui ao teu cigano
que me quebrou duas costelas
que me rompeu os ligamentos
e que me disse tantas vezes:
é perigo, afaste-se, curve-se
e deixe que ela viva em paz.

e eu nunca te deixei em paz
eu nunca obedeci teu cigano
mas agradeço ao teu cigano
por te fazer mestra e mistério
da minha total insubmissão.

por este amor que acumula
poeira em nossa fresta comum
alguma geleira pelos cantos
dessa dor maior que costela
maior que ligamentos ruins
bem maior que eu e maior até
que o teu cigano, ai de mim!

essa poeira, meu amor, só existe
porque fizemos o nosso canto.
só se suja o que permanece vivo
e ainda não somos todo um pó
que nos faça duvidar dessa ideia.

eu nunca vi um amor limpo
mas vi muitos que na poeira
não souberam viver um dia.

teu cigano me exigiu pular
de olhos abertos e gritou:
vai doer, vai ser gigantesco
e vai ser impossível parar
se não for como eu quero.

deixe que ela viva plenamente
ele me disse e mesmo assim
eu me pus ao teu lado e falei:
anda comigo até no inferno?

acho que essa coragem cega
amoleceu o teu cigano de fé
para que não me trucidasse.

por isso agradeço ao cigano
e darei a ele um lindo colar
dos meus ossos mais sadios.

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