confesso que me sinto muito
mal,
nauseado, com pressão irregular,
quando leio um trecho
genial
de alguém que posso
abraçar.
acontece muito com a rita
isadora,
que vez em quando vem
com uns
maremotos e fendas que
se abrem.
eu nunca me sinto bem
quando digo
que adorei as imagens ou
que fiquei
sem fôlego ou que
aquilo me matou,
porque no fundo chegar
muito perto
do gênio causa náusea,
pressão baixa,
acima de tudo se quem traz o gênio
é alguém que eu posso
abraçar, amar.
outras vezes a coisa acontece
com escritores de que
não gosto;
daí é quase muito bom,
mas não
se pode confiar demais
nas boas
sensações, então, um
pouco tonto,
acabo triste porque não
abraçaria
este gênio mesmo sendo
genial.
quando converso nas
ruas e bares,
que frequento agora
muito pouco,
estou sempre pensando
enquanto
escuto todo tipo de
elucubração:
diga tudo, mas não seja
genial, ok?
e a contrapartida disso
é que não
entendo o que as
pessoas dizem.
se é um fiódor dostoievski,
oquei,
pouco me afeta, sinto as
borbulhas,
vai tudo bem, bom que
seja genial,
mas fiódor é um busto
carrancudo,
está a anos-luz da
minha precária
compreensão desse mundo
canino.
só não me venham vocês,
pessoas
que amo e que posso
abraçar, roer
a frágil estatura dos
meus nervos.
vocês eu posso abraçar –
é a única
coisa que eu posso
fazer sem medo.
no mais, terei um
choque elétrico
a cada vez que me
vierem com tais
peças de humor sensíveis
e afiadas
sobre a desgraça que
vivemos mas
ainda de cabeça erguida
e capazes
de abraçar e de rir um
pouco disso.
perto do gênio arruinaríamos
isso,
seria atear uma
fogueira alta demais
e num minuto estaríamos
morrendo
de bílis negra e fadiga
de compaixão.
não sei o que é melhor
à sociedade
– a mim é melhor poder
abraçar
da maneira mais
estúpida à mão
e nunca ser gênio,
nunca destruir.
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