27.6.15

"matadouro"


agora tomo banho, me arrumo,
aparo os cabelos nas orelhas
e os bigodes de leão marinho,
pois hoje vou ao matadouro.

no matadouro pessoas tecem
opiniões relevantes sobre assuntos
concluídos, os matadores de mim
leem de tudo e sorriem frios.

são simpáticos, mas é possível
também imaginá-los delatando
alguém por uma bolsa ao mérito.

são charmosos e pagam bebidas,
amam com mel de abelha e foices,
enquanto afiam solidárias adagas
e notam a perfeita circunferência
dos pescoços de suas vítimas.

é acima de tudo no matadouro
onde a vida e o sangue flutuam
em curtos vapores de humor,
onde compartilhamos moscas
por dentro dos olhos virados.

falamos as letras, sempre elas,
que, mais que lâminas e balas,
dão polidura ao surto do sangue.

agora pronto, é chegada a hora,
rápidas memórias, como flashes,
alucinam o peito na expectativa
de que a dor seja como um raio,
um corte seco no que inaugura
com vísceras a temporária casa.




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