31.1.15

"balada para gilbert ginsburg"


é preciso que chores baixinho agora
porque papai está com pés inchados
no chão de um mar de adivinhações
e mamãe cativa costurou seus olhos.

agora enxergas o que se extermina
quando a noite quebra seus ossos
e estás mais uma vez diante deste
lugar onde papai e mamãe foram
e onde foste concebido com amor.

gilbert ginsburg, meu bom amigo,
não se duvida das boas intenções
em precaver-se da dor deste parto.

é preciso deslizar ainda um pouco
mais por esta agudíssima voragem
em que nada se mexe, mas tu cais.

canto a ti porque reténs o nome
do que desperta em plena queda
e se queima com o ácido do sono
forçado, sabemos, pela diminuta
cápsula onde guardas teu segredo.

baixinho, querido, estamos juntos,
no quase silêncio que vai tão longe.
abracadabra agora, e já vais dormir.

Um comentário:

Isadora P. disse...

é lindo e tão doloroso esse poema.

a cadência é essa mesma que antecede o sono, litânica, uma prece em desalento e com uma fagulha de esperança que a palavra não alcança e os olhos não veem.