8.7.10

“tua carne não apodrecerá, Roberto Piva”

Roberto Piva (1937 - 2010)



poderia algum dia, Roberto Piva, como agora,
ser que víssemos nas tuas roupas neo-realistas,
na tua rica juventude, estuprada por São Paulo,
a quem odeia, São Paulo, mas a ela dá as tripas,
porque apenas em tripas e ódio nos damos todos,
e a criação vem necessariamente do ódio coletivo
de sermos, apesar do estupro-fascínio, dependentes
da beleza e das bandanas nos pescoços-caravaggio
e dos passos de sapatos com solas de madeira
descendo pelas escadas com a tinta paranóica.

quimicamente desejáveis e não é o que todos querem?

não, Piva, deus da sarjeta incandescente dos profetas,
eles querem tuas fotos nos jornais e mais meia dúzia
de poetas ordinários se refestelando sobre tua carne,
aos prantos, desejando a ti uma boa passagem,
e eles – é claro, Piva – ah, mas eles não sabem
das calçadas ensangüentadas, dos tiros noturnos,
e, muito menos ainda, Piva, eles sabem que não é
para ti este mundo, onde se enterram no papel
os poetas eternos: nesse jogo, disso eles sabem,
ficam as moscas e, atemporal, a carne apodrece.

Um comentário:

Uilma de Andrade disse...

Leo, até que fim Inverno saiu do pr
ego!!! Bjooos