2.7.10

"roman jakobson"

a vida cotidiana
é apenas um sucedâneo
da síntese do futuro.


(vladimir maiakovski)

agora o câncer é a poesia
da medicina, e não valem
mais os gestos de punho
seco, as mortes políticas,
mata-se finalmente por
vaidade, e como é belo
o amor falso no qual nos
baseamos, e como é bom
transar sem camisinha,
aturar em silêncio a veia
que derrubou os cossacos,
e agora nós só transitamos
entre estranhos talvez com
armas de tiro e que nunca
sabem, tanto quanto nós
não sabemos que ainda
é cedo e pálido crepúsculo,
para esperar o dia frágil
quando não há tiro nu,
conversa-se, droga-se,
e estamos nus no tempo,
e a gosma que deveríamos
apreciar está mais abaixo
e temos medo e por isso
vamos longe, de cabeça,
mas já não há mais tiros
no peito de uma geração
inteira diluída em dúvidas:
estamos perplexos, rindo
do sabe-se lá o quê, a base
fugiu para longe, os peitos
sob a mão não amedrontam
e nem o suicídio é algo raro,
pergunta-se: mas e se não for
maiakovski, por que interditar
a passagem do tempo? - talvez
seja leitura demais, vivemos
o tempo da leitura demasiada,
amplos no aspecto pequeno,
e não sabemos, pobres de nós,
que o tiro já foi dado no tórax
e não nos resta nada mais que
a simples primavera esgotada.

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