3.7.06

“a maior carta de todas”

hoje recebi a maior carta de toda a minha vida.
elas sempre chegam à tarde, quando são perfeitas
ou tarde, quando você pensa que é cedo ainda.
eu voltava do comércio, os pés sujos de areia
dentro do bolso um papel arranjado na padaria
onde havia anotado com tinta vermelha:
“os pés revelam tudo que o coração aniquila”.
entrei no prédio depois de ter observado
por um tempo
sua fachada de ladrilhos
que tanto me lembrava
do quanto eu já havia me esquecido.
mas antes de me arrastar até o quarto escuro sem revelação
desconfiado dos meus próprios pés imundos
fui conferir a correspondência.
e ali estava um envelope.
um envelope amarelo gema.
um envelope simples, compacto e amarelo
com o destinatário em letras de forma garrafais:
“AO POETA”.
e dentro do envelope amarelo
como disse há pouco a vocês
a maior carta que recebi na vida
a mais extensa, que me fez pensar longamente
uma carta que dizia tudo que havia para ser dito
que esclarecia todas as minhas dúvidas e dores
uma carta que só não me fez chorar porque
dentro de mim já não havia mais água.
e dentro do envelope não havia carta.
e dentro da carta havia tudo.

4 comentários:

Anônimo disse...

porque havia o nada!

Anônimo disse...

talvez não sejam só os pés que revelam tudo que o coração aniquila, as cartas também...

Anônimo disse...

“os pés revelam tudo que o coração aniquila”. adorei essa frase e o resto também.

Garota do outro lado da rua disse...

uma carta com todas as respostas....? ah! é tudo que queremos.

Lindo texto.

bjos
Naira