24.3.06

os malditos não choram
ou
elegia ao pão de cada dia
Dedicado a John Coltrane e Tia Mulata
pão beijo na boca padaria madrugada café na cama ereção matinal namorada filé com fritas tédio fugidio declínio a cama levita uivo desejo pálido cópula evita destino trágica relação mutante orgulho cálido ovulação borbulhante de pus sangue escárnio casamento.

pão bebum no ralo da sinuca bafo de pinga punho escarro fétido na cara tapa de quem parece tua própria cara lavada amarga verniz da morte acalentada acende desfiladeiro armas e corações partidos copos de vidro mesas onde brindávamos olhos fechados todos até o fim da noite amizade.

pão passo firme soalho ímpeto de mãos vazias aos prantos pavor pecado bafo frio cigarro meias longas unhas curvas túmulos dos teus desejos medonhos sonhos cultivados sempre para serem corroídos ombros em contrações latentes do teu sorriso sujo guardado junto do teu contato em esponjas no sol da luz do banho sob o olhar preguiça que guarda costas até a noite quando sinais repetem sonhos que se repetem hoje quando sou inútil sem tuas sardas no meu travesseiro.

pão que trás e leva esconde pecado perdão diário de dó de ló de nossas mentiras feitas de alho no ritmo do vai e vem do nó da aureola sobre a viga pulsante recente mácula a cada pão que sopra o hálito do diabo nas orelhas maltratadas por razões entranhas estranhas ao próprio diabo que é você mesmo camisa esgarçada calças cofrinho com saco de pão nas mãos voltando pela madrugada sozinho cara lavada perfume para outra até cair nos braços da mesma maior pecadora aceita e recolhe os cacos da fatia de amor que sobra da devassidão.
pão eterno cúmplice único a quem não precisamos jamais perdoar por seus farelos ou pedir perdão pelos sacos escuros onde os guardamos à noite quando só as formigas se mexem para sempre abandonados nos ganchos chumbados em parede frias capachos da dor para cuja cura muitos murmuram destinos pecados mentiras.

Um comentário:

Anônimo disse...

Estranho e otimo.
Abraco.