25.5.21

"poesia"

 

em geral é muito feia,

me dá dor de cabeça.

mas, quando é bonita,

não encanta ninguém.

 

uma boia no deserto,

bússola de aquário,

ferino toque de cura,

uma fuga autorizada

– piloto automático

rumo a lugar algum.

 

espero a sua chegada

como uma cafetina,

um poeta argentino,

espera pelo seu puto.

 

se falo mais que devo,

você me pede silêncio:

uma fanática religiosa.

 

mantemos negócios

apenas porque trago

por dentro das calças

                 uma bomba

                 com teu nome.

9.5.21

"aos que ficam"


a casa não está suja nem limpa,

o coração anda frágil, as roupas

violentaram a máquina de lavar

de modo que ela pareça asfixiada

e seus trancos queiram me dizer:

por favor, me ajudem, socorro!

 

as contingências agora impedem

que nos ajudemos uns aos outros

com a mesma facilidade de antes

e nunca precisamos antes de ajuda

como precisamos todos nós agora.

 

calhou de sermos nós a geração

destinada a assistir a tão inéditos

horrorores e ainda atravessá-los,

ou ser atravessada por eles, isso

é o tempo que vai dizer, dizem;

eles sempre dizem alguma coisa.

 

não faz sol ou chuva, frio ou calor

no ventre deste colapso todo nosso,

nos milhares de rascunhos humanos

que a natureza perversa dos desejos

fez apagar para sempre nas sombras.

 

ficando por aqui me dá impressão

de que as melhores pessoas estão

nos deixando e só nós, os terríveis,

ficamos aqui para ver o gran finale.

 

mas então lembro de várias pessoas,

que vivem e se debatem lindamente,

de alguma forma na ponta dos dedos,

trazendo consigo a doçura e a fúria,

o arremesso e o pouso da existência,

então fico feliz por ter ficado para trás.