porque talvez eu morra
feliz de morrer por
aventura
finalmente equiparado
com minha verdadeira
loucura
talvez eu morra de
olhos abertos
na velocidade
vergonhosa com que
se faz amor pela
primeira vez.
porque talvez agora
seja a melhor vez de morrer
e porque sinto
ilusoriamente que estou preparado
que meu amor tem
tamanho semelhante ao da morte
e que agora meus amigos
poderão se lembrar de mim
como a um herói possível
na estante de reposição.
pena não vieram os
louros que de malucos fazem ídolos
– deste cacho não virá
tua banana explosiva de chiliques
aprendi a dormir, a
sonhar, mas não me lembro do sonho
é tarde lá fora, os
poetas voltaram a se tratar com cordas
e as bocas estão sem
dentes na chance firme da tua nuca.
porque talvez eu morra
em paz de verter minha
loucura
num propósito senão
eficaz
ao menos de infantil delírio.
tornar a sujar a casa
com palavras
guardar com zelo
granadas no bolso
desfrutar o sangue da
casa bruta.
erguerei meu corpo
mentiroso
na altura que para a
noiva negra
seja possível me marcar
um xis.
conhecerei hoje a
máquina
que faz de mim um
farelo
e finalmente um elo de
algo.
uma pena não ter a alma
tão leve
a ponto de poder voltar
um dia
e contar para vocês a
maravilha
dessa passagem se
comparada
a qualquer coisa vista
por aqui.
queria dizer que foi
bom
queria dizer vejo vocês
mais tarde
mas no lugar para onde
me dirijo
não se fala nem se
escuta, não é
preciso fazer esforço
para nada.
lá se descansa – sente-se
saudade
de sofrer e dos amigos e
inimigos
que ainda não deram o
ar da graça.
porque talvez eu morra
agora
porque talvez eu deva
nascer.