A ORELHA DO LIVRO, DO ABUJAMRA:
AVALANCHE
Esse autor não é fanatizado pelo árduo trabalho que é o fazer poesia. (João Cabral colocava um verso na gaveta, deixava seis meses e depois o buscava para ver se ainda servia para o poema inteiro).
Esse autor não é fanatizado por escrever biografias autorizadas ou não-autorizadas (conhecer os outros é quase impossível).
Esse autor é uma avalanche de vida toda fecundante de um estranho conhecimento de autores, atores, poetas, putas, números, literatura brasileira, portuguesa, européia profunda – enfim, nos deixa ao lê-lo com uma irrespirável vontade de fugir dos Gôngoras da inteligência.
Quer falar de tudo, sobre tudo, quer que Ezra Pound se foda, odeia os assassinos de Maiakovski, passa por Rilke como se as Elegias de Duíno fosse o livro mais popular do mundo – sobe em cima de Rita Hayworth, quer Neruda e sua poesia no poder, bebe Bukowski, esbofeteia Ulisses, não se preocupa com seus bagos sujos e mais mil coisas que o levam a escrever, escrever, escrever.
Essa avalanche tem uma honestidade de cristal como um Kierkegaard, seus poemas apaixonados e ao mesmo tempo distanciados brechtianamente fazem da leitura um prazer que deixa nossas diametrais vivências querendo saber onde vai chegar.
E isso é o que menos importa, pois quer ler Nietzsche e influir em seus escritos, quer ser Unamuno para ser Reitor da Universidade de Salamanca e enfrentar os fascistas de Franco achando que estão ainda ao nosso lado.
E estão.
É uma avalanche para lermos, e sobra ao poeta a clarividência e a fidelidade de suas idéias, cambiantes ou não, e leva esse livro com sua avançada juventude, para ele ter uma relevância central em sua vida.
Tem que escrever, mais, mais, mais e, de repente, escrever menos, menos, menos.
Essa é a engrenagem para a mecânica dos poemas entrarem em seus nervos e carne, palpitação, catedral de ânsia e beleza.
Antônio Abujamra
E, por favor, apareçam todos...