(ou, romanticamente falando: “do ato de criação”)
primeiro se forma como uma bolha de espaço entre os pensamentos,
uma bolha que a princípio não causa nada além de um inchaço,
mas que o tempo enche até tornar o cérebro e todo corpo bolha.
então essa bolha se enche de mim – eu passo a me confundir com ela.
é claro, para tal são necessários:
uma tragédia,
uma brusca ruptura,
em suma, um nascimento.
a bolha então se disfarça em grandes calos de paz
para reanimar minhas forças e desviar minha atenção.
então acredito que tudo não passou de absurdo, nonsense,
entretanto a cabeça inchada, o nariz entupido, a vontade mórbida.
uns voltam às suas desatividades,
outros retomam sua radioatividade,
muitos matam, poucos sobrevivem,
mas estamos todos lá.
eu me sento espantado no sofá
da sala onde existe uma televisão.
uma sala simples, sofá cadeira,
uma sala clara, uma alma de mentira.
a bolha, inchada demais para prosseguir intacta,
escorre em pus pelos meus olhos: não são lágrimas.
olho para minhas mãos,
mãos que passo os dias comendo porque não me dão nada,
minhas mãos macias como memória distante,
como um dia me disseram: inaptas ao trabalho árduo.
elas ainda não me dizem nada,
mas já não são mais minhas mãos, estão inchadas:
tornaram-se bolha também.
estão feridas também, mas já não têm mais medo:
esperam ansiosas e urgentes pelo destino injusto.
sento-me então de frente para o infinito,
humilde e distante, passivo.
olho de novo para as mãos:
estão transparentes, cheias da minha própria substância,
mas me contestam, me levam à loucura, criam códigos indecifráveis,
mãos transparentes mas me atocaiam na escuridão de muros fictícios,
mãos que não respeitam minhas necessidades vitais ou meus desejos.
sem saber o que fazer, me deixo abduzir pela verdadeira posse,
e uma ausência louca de rédias se apodera do meu patético-frágil.
levanto, apanho uma faca:
as mãos precisam desaguar
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Um comentário:
gostei muito. parabéns viu!?!? vou voltar sempre aqui. ;)
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