25.12.24

"basquete matinal"


pílulas questionam

meu canto puritano,

incham meus passos

com sangue adverso.

 

os gatos se esfregam

com a feia burocracia

de um plano de saúde.

 

se eles soubessem,

talvez lentamente

soltariam um longo

suspiro de humano.

 

todos somos derrotados,

os vencedores bem mais.

isso dá alento, para além

do fim da nossa espécie.

 

a fatal presença soberana

do corpo, diante da mente,

a mente que pensa mundo

mas vive dentro do corpo

que é cego, surdo e mudo,

e dura menos que a gente

evoluída no corpo-a-corpo.

 

sou um boneco de ventríloquo

que faz rir um doente terminal.

lavo hoje a pia intacta da sorte

e não os pratos sujos do desejo.

 

aqui de joelhos no tapete do caos,

sobrevivo com uma bola na mão

e todas as minhas armas no chão

fazendo pazes no coração deserto.

com essa bola eu crio um silêncio

imenso como um dia foi nossa fé.

redonda, ela cabe entre as mãos.

 

na direção dessa bola perfeita,

as bolas dos olhos só esperam

o som do rugido do pano sujo

quando a bola penetra o sonho.

 

no bandejão das nossas almas,

duas mãos se erguem no vazio.

deram tudo que podiam apenas

para ter um instante geométrico:

entre o coração, as mãos, a bola,

na manhã que preenche o medo

de expectativas afora e adiante.