12.6.20

“todo dia é o dia do teu dia”


para bichita

ela é muito mais grandiosa
que os meus pensamentos,
morena ou loira ou careca,
me diz que à noite esfarelo
os dentes finos de jumento
como se comigo carregasse
uma tonelada de desespero
capaz de matar um cavalo
ou deixá-lo sem os dentes.

sou um cavalo pé-de-pano
triste no desenho animado
e eu sei que será o meu fim
quando a mandíbula feroz
que sustenta essa voz ruim
de um pinguço aposentado
afrouxar todo peso da vida
porque nunca soube amar
e amo como um alucinado
a única feiticeira medieval
que, contra todo conselho,
montou o cavalo vira-lata
e, sem esforço, flutuamos
por sobre pedras e abutres
e quantas vezes esfreguei
a língua contra as paredes
da sorte a fim de pousares
em mim teu olho amarelo
que afasta os abutres e tira
pedras da ferradura antiga
como o próprio apocalipse.

todo dia é o dia do teu dia,
tu que és punk de pracinha,
deusa gótica de um baralho
cujas cartas catas pelas ruas
na profusão de mil planetas
que se movem rumo à voz
que grita pelo fim do açoite
quando por fim galopamos
com a coragem que persiste
em toda canção de protesto
e nos dentes que eu te darei
como prova do meu desejo
de povoar tua magia aberta
com meu surto de ossadas
no fundo do teu caldeirão
com mistério que justifica
os contornos do precipício
pelas linhas das tuas mãos.



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